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OPINIÃO: Como a morte de Ayrton Senna mudou a F1 para sempre

Marco Romandini
As corridas nunca mais foram as mesmas após a partida do brasileiro
As corridas nunca mais foram as mesmas após a partida do brasileiroProfimedia
A Fórmula 1 só começou a pensar numa revolução após a morte do brasileiro Ayrton Senna. Uma revolução que finalmente aumentou a segurança dos pilotos, mas que também trouxe o fim da "era romântica" do esporte.

"Ayrton para nós, pilotos, era Deus. Ver Deus partir foi terrível. Para mim, havia uma vida antes e depois de 1° de maio de 1994″.

É assim que o piloto francês Eric Comas recorda o grande piloto brasileiro, que lhe tinha salvado a vida dois anos antes de perder a sua. Estávamos em 28 de agosto de 1992, no circuito de Spa, na Bélgica.

Comas conduzia o seu Ligier nos treinos de sexta-feira, perdeu o controle, bateu, perdeu a consciência e desmaiou, com o pé preso no pedal do acelerador e o motor ligado.

Ayrton passa e vê a cena. Ele para o carro, desaperta o cinto de segurança, sai do veículo e corre em direção ao francês.

Observa, desliga o motor que estava em risco de explodir, depois abre a boca de Comas, que estava em risco de asfixia, como aprendera com o seu médico Sid Watkins. Salva-lhe a vida.

"Sem a sua ajuda, o meu Ligier teria explodido. Se ele não tivesse desligado o motor, eu teria me engasgado com a minha própria língua. Ele apoioi o meu pescoço enquanto eu estava inconsciente. Ajudou-me quando até o meu colega de equipe se tinha afastado. Tinha um coração puro e extraordinário", lembra.

A triste vez do brasileiro

Dois anos depois, Imola. Ayrton está acidentado no muro da Tamburello, Comas não sabe e parte para a sua volta de qualificação com a corrida parada.

Passa em frente à curva fatídica, vê uma Williams encostada ao muro, olha para o capacete - está verde: é o piloto que é o seu salvador e amigo. Quer sair para o ajudar, mas os médicos já chegaram.

"Paro a Larrousse, saio do carro e percebo que o Ayrton tinha tido um acidente, vejo o seu corpo na grama e estou prestes a aproximar-me. Os médicos me colocam na ambulância e entendi imediatamente que era o fim, sem ninguém me dizer nada", recorda Comas.

Comas regressou aos boxes perturbado e tomou uma decisão drástica: "Decidi não correr, abandonei o circuito. Enquanto estava no aeroporto, estavam mostrando imagens do acidente e, pouco antes de entrar no avião, chegou a notícia. Decidi retirar-me imediatamente da Fórmula 1. Não queria continuar a correr, mas o dono da equipe convenceu-me a continuar na época. No final de 1994, retirei-me definitivamente."

Memorial de Senna e Ratzenberger em Ímola
Memorial de Senna e Ratzenberger em ÍmolaAFP

Ano zero

A morte de Ayrton não mudou apenas a vida de Eric Comas, mudou a Fórmula 1 para sempre. No dia anterior à morte do brasileiro, outro piloto tinha perdido a vida em Imola, o austríaco Roland Ratzenberger.

Se para o primeiro foi fatal um pedaço do suporte da suspensão, que o atingiu na viseira, para Ratzenberger foi a asa inferior que foi parar debaixo dos pneus, impedindo-o de frear, mas também de guiar. Duas dinâmicas diferentes mas, como a quase tragédia de Comas também tinha demonstrado, a mesma conclusão: a Fórmula 1 é perigosa.

Em 1989, foi outro austríaco, Gerhard Berger, que acabou com a sua Ferrari contra o muro daquela maldita Tamburello. Felizmente, naquele caso, a equipe de resgate conseguiu domar as chamas em 20 segundos, permitindo que os médicos chegassem ao local e salvassem a vida do companheiro de Senna.

Sete anos antes, Riccardo Paletti e a lenda da Ferrari, Gilles Villeneuve, tinham perdido a vida na F1.

Choque de realidade

Durante mais de uma década, desde esses trágicos acidentes, a Fórmula 1 teve a ilusão de que apenas tinha tido azar. Foi a morte do grande piloto brasileiro que a trouxe de volta à realidade.

E talvez só a dele o pudesse ter feito, devido à importância da sua figura no esporte e no coração de todos os fãs.

A F1 reintroduziu os melhoramentos eletrônicos que tinham sido abandonados (contra a opinião do próprio Senna que, com carros cada vez mais rápidos, já tinha previsto tudo), implementou mais chicanes, reformulou o GP de San Marino, limitou a velocidade nos boxes e introduziu novas penalizações para os duelos.

Tornou-se, assim, menos perigosa para os pilotos, embora em 2015 tenha visto mais uma morte, a de Jules Bianchi, que ficou 9 meses em coma depois de um polêmico GP do Japão.

A Fórmula 1 tornou-se mais segura. Uma escolha acertada, mas também menos atraente. Foi-se a era dos pilotos românticos, dos duelos de fazer prender a respiração, dos ícones da velocidade.

Durante mais de uma década, as corridas foram decididas pelas estratégias dos boxes e, sem as ultrapassagens espectaculares, tornaram-se chatas.

O esporte dos corações intrépidos perdeu fãs, interesse, fascínio e ícones. Deixaram de existir Senna, Prost, Mansell, Berger e todos os outros que, naquele contexto de risco, trouxeram pura adrenalina à competição.

A morte de Senna mudou para sempre a Fórmula 1 que, depois do risco em excesso e das subsequentes medidas de segurança, procura sempre um novo equilíbrio para restaurar o espetáculo.

É também o que desejaria Ayrton, que lá de cima talvez nunca tenha deixado de assistir às corridas.

Marco Romandini, editor do Flashscore Itália
Marco Romandini, editor do Flashscore ItáliaFlashscore