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Futebol 360 com Betão: Ainda existe amor à camisa no futebol?

Betão
Cássio está no Corinthians desde 2012
Cássio está no Corinthians desde 2012Flashscore / Profimedia
Caros leitores, hoje quero falar com vocês sobre um tema polêmico: o tal do “amor à camisa” no futebol.

Existem muitas pessoas, principalmente as mais saudosistas, dizendo que o amor à camisa acabou entre os jogadores. Mas, para que esse texto faça sentido, precisamos voltar alguns anos na nossa linha do tempo. 

Até mais ou menos três décadas atrás, era notório o comportamento dos atletas em relação aos clubes que defendiam. Era comum ver atletas permanecerem por anos nos mesmos clubes e existia uma enorme identificação entre clubes e atletas. Parecia que nada faria com que alguns atletas deixassem os clubes. Um parecia que tinha nascido para o outro.

Reinaldo é um dos maiores ídolos da história do Atlético-MG
Reinaldo é um dos maiores ídolos da história do Atlético-MGPedro Souza / Atlético

A impressão que tínhamos era que os atletas davam a vida por aquela camisa. Um dos exemplo é a emblemática imagem do ex-lateral do Corinthians, Zé Maria (ou simplesmente Super Zé), com a camisa banhada de sangue durante a final do Paulistão de 1979, após ter um corte na cabeça. Mesmo assim, ele permaneceu em campo com a mesma camisa ensanguentada até o final da partida. 

Aquela imagem se tornou símbolo de raça, dedicação e amor à camisa. Ele jogou pelo Corinthians durante 13 anos (entre 1970 e 1983), atuando em 598 partidas pelo clube. Citei o exemplo do Zé Maria mas poderia ter citado vários outros exemplos daquela mesma geração e de algumas outras.

Quando fala-se em Zico, já se pensa em Flamengo
Quando fala-se em Zico, já se pensa em FlamengoProfimedia

O que mudou de lá pra cá?

No meu ponto de vista, a maior mudança não foi na atitude dos atletas, mas sim na globalização do futebol. Naquela época, não existia a saída de atletas brasileiros, com frequência, para atuarem no exterior. 

Não existia essa atração tão forte. A maior ambição dos atletas era se “divertirem” e serem jogadores de futebol no clube de coração ou no clube de formação. Com a globalização no futebol, apareceu um novo atrativo e novas ambições.

Os atletas sonham, desde cedo, em jogar em um clube do exterior e não precisamente da Europa. Ainda no final da década de 90, não era comum a saída de jovens jogadores, a não ser os chamados “fora da curva”, como Ronaldo Fenômeno

Lembro-me bem de quando eu ainda estava nas categorias de base do Corinthians. Meu maior sonho era entrar no estádio do Pacaembu lotado com a camisa do Corinthians e ver a torcida gritar o meu nome. Aquilo para mim seria o ápice e acabou acontecendo.

Ronaldo foi exceção de jogador vendido ao exterior na sua geração
Ronaldo foi exceção de jogador vendido ao exterior na sua geraçãoGustavo Aleixo/Cruzeiro

Atuei por 14 anos no clube (dos 10 aos 24 anos) e criei uma identificação enorme. A identificação foi tão grande que, para muitos, ainda sou lembrado como Betão do Corinthians, mesmo depois de 16 anos da minha saída do clube. 

Hoje, ao conversar com os jovens atletas, 95% deles não fazem questão de jogar na equipe principal. Isso não é mais atrativo para eles. Se possível, ainda querem ser vendidos nas categorias de base. Não adianta querer mudar essa mentalidade dos jovens atletas, os tempos são outros. 

Mercadoria

Vejo algumas pessoas julgando esse comportamento dos atletas, chamando-os de mercenários. Não concordo. É óbvio que a questão financeira se torna um atrativo maior para essa mudança rotineira de clubes. Hoje em dia, é raro ver um atleta permanecendo no mesmo clube por mais de cinco anos. Mas um fato a ser destacado é que os atletas entenderam que são tratados como mercadorias valiosas. Por isso, se comportam como tal. 

Ademir da Guia é um dos ídolos eternos do Palmeiras
Ademir da Guia é um dos ídolos eternos do PalmeirasPalmeiras

O que quero dizer com isso? Quando acabar o rendimento do atleta, ele será colocado de lado e seu prazo de validade estará vencido tanto para o clube como para a torcida e imprensa. E o atleta, sabendo disso, busca aproveitar seu momento e as oportunidades que surgem ao longo de sua curta carreira. 

A exposição e o julgamento são muito maiores do que em outros tempos. Com isso, sempre que surgir uma oportunidade para o atleta se projetar no mercado ou dar uma alavancada na vida financeira, ele não pensará duas vezes. Isso quer dizer que os atletas estão corrompidos pelo dinheiro? Não, isso quer dizer que aprenderam a se comportar da maneira que são tratados: como mercadorias. 

Betão é o zagueiro que mais defendeu as cores do Avaí
Betão é o zagueiro que mais defendeu as cores do AvaíProfimedia

Ainda temos jogadores identificados com clubes?

Existe uma carência enorme de ídolos nos clubes. Quando digo ídolos, não estou falando do artilheiro da equipe, mas sim daquele que se identifica com o clube. É claro que, nos dias de hoje, ainda existem jogadores com identificação com os clubes, aqueles que jogam por amor à camisa.

Mas, na maioria dos casos, o perfil desses atletas é outro. Normalmente são atletas mais amadurecidos, com uma certa experiência, que chegam e acabam se identificando com a cultura de um determinado clube. 

Dudu tem grande identificação com o Palmeiras
Dudu tem grande identificação com o PalmeirasCesar Greco/Palmeiras

Eu fui um exemplo disso. Não fui formado nas categorias de base do Avaí. Cheguei depois dos meus 30 anos. Joguei por seis anos no clube, fui o zagueiro que mais vestiu a camisa em todos os tempos (271 jogos), o sexto atleta que mais atuou pelo clube e me tornei um dos ídolos da história deste clube centenário.

Mesmo que sejam poucos, hoje em dia ainda vemos nos grandes clubes, atletas que demonstram ter esse amor à camisa, como por exemplo: Cássio, Fágner, Renato Augusto (Corinthians) e Dudu (Palmeiras).

O que é o amor à camisa?

Na minha visão, ter amor à camisa não é ser um torcedor de berço do clube, mas sim respeitar a instituição, as tradições, sua história, os torcedores e a cultura de um clube. É saber que, ao vestir a camisa de um clube e entrar em campo, nada mais importa. O atleta deve ter a consciência de que está carregando junto com ele uma multidão de apaixonados que o têm como o maior representante de sua paixão. 

Toninho Cerezo criou forte vínculo com as camisas do Atlético-MG e São Paulo
Toninho Cerezo criou forte vínculo com as camisas do Atlético-MG e São PauloPedro Souza / Atlético