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Perder um amigo e um "grande cliente", a dor dupla do barbeiro de Pelé

AFP
Em meio a tesouras e pentes, estão pendurados retratos de grandes conquistas em campo do melhor jogador da história
Em meio a tesouras e pentes, estão pendurados retratos de grandes conquistas em campo do melhor jogador da históriaAFP
O barbeiro João Araújo, mais conhecido como Didi, já tem saudades do seu cliente mais fiel, mas também de um querido companheiro: Pelé, o saudoso craque que lhe confiou os cabelos por mais de seis décadas.

"Perdemos um símbolo muito grande, perdeu o Brasil e perdeu o mundo. E o Didi perdeu um grande cliente, um grande amigo", disse o cabeleireiro de cabelos brancos minutos depois de arrumar o penteado de um adolescente de 15 anos que usava a camisa do Santos, time onde o "Rei" fez a maior parte de sua espetacular carreira.

Confira cobertura da despedida de Pelé

Vários curiosos lotaram nesta sexta-feira a barbearia do Didi, localizada a poucos metros do estádio Vila Belmiro, casa do "Peixe" e onde o ex-atacante será velado de segunda a terça-feira após falecer na quinta-feira aos 82 anos em São Paulo em decorrência de um câncer.

Em meio a tesouras e pentes, estão pendurados retratos de grandes conquistas em campo do melhor jogador da história, e também duas fotos que mostram uma grande amizade entre um homem e o seu barbeiro: numa, em preto e branco, aparecem o jovem Didi e Pelé. Na outra, a cores, fica evidente a passagem do tempo.

Criador do topete de Pelé

O salão de Didi, de 84 anos, tem ares de museu, dedicado quase exclusivamente ao homem que levou aos quatro cantos do mundo o Brasil e seu futebol. Seu letreiro, preto com letras brancas e dois escudos do Santos, dá pistas do que os clientes podem esperar: "O cabeleireiro do Pelé e seu também".

A amizade do craque com o barbeiro durou 66 anos. Quando tinha 16 anos, o futuro camisa 10 procurou em Santos alguém que pudesse dar um toque em seu cabelo preto e crespo. E o encontrou em um torcedor do clube alvinegro e conterrâneo mineiro.

“Lembro dele chegando, era um garotinho, a gente não dava nada por ele. Só pensava que ele era só um bom jogador, mas rei não. E o cara chegou a rei e morreu rei”, diz Didi.

O adolescente Edson Arantes do Nascimento saiu do primeiro encontro com seu clássico topete, penteado que o acompanhou durante boa parte da vida, inclusive quando conquistou os dois primeiros títulos mundiais do Brasil (1958 e 1962), duas de suas maiores glórias ao lado do terceiro, em 1970.

"Ele gostou muito e fiquei cortando o cabelo até a hora da morte", diz o cabeleireiro, que na época trabalhava no mesmo estabelecimento de hoje em dia. O barbeiro calcula que atendeu Pelé mais de mil vezes, quase os 1.283 gols marcados pelo astro.

O ex-jogador o visitava no pequeno local, com decoração clássica, quase paradas no tempo, chamando a atenção dos transeuntes. Quando seu estado de saúde piorou, Didi foi até a casa dele, no Guarujá.

"Sempre me chamava"

A última vez que colocou as mãos na cabeça do "Rei" foi no ano passado, antes que a saúde do único jogador a conquistar três Copas do Mundo começasse a se deteriorar devido a um câncer de cólon detectado em setembro de 2021.

"Ele sempre chamava e eu ia lá, para cortar o cabelo dele. Mas de um tempo para cá ele ficou mal mesmo e não deu para ir lá", explica, recordando as conversas "sobre futebol" que tinha com o ex-craque enquanto o atendia em sua velha cadeira.

As câmeras fotográficas e de vídeo de um punhado de jornalistas registram seus movimentos delicados e concentração de monge na reta final de um corte, dias antes da despedida de Pelé na cidade que ficou famosa por seus lances geniais nos gramados.

Didi diz sentir "tristeza" pela partida do amigo e cliente fiel, a quem, como qualquer outra pessoa, cobrava 40 reais por seus serviços. "Era o mesmo preço, nunca teve dois preços", garante, antes de dar outra tesourada.